Pesquisar este blog

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Do baú: Rótulos!

E fechando a série de antiguidades de hoje, texto que lendo agora me apraz.


Quem sou eu, me pergunto de vez em quando. Já respondi esta pergunta algumas vezes, o blog é a maior prova disso. Mas mesmo assim, acabo sempre sem saber quem sou no todo – rótulos, clichês, gêneros, grupos. O certo de todos estes momentos é que não sou contido neste ou naquele rótulo – um pouquinho neste, outro pouquinho naquele, mas nunca totalmente contido. Um que me vem à mente agora seria o grupo daqueles que não se conseguem digitar um texto se não for justificado e espaçamento entre linhas de 1,5 – síndrome de Tadeu, talvez. Mas enfim, mesmo as manias deste que vos escreve não o abarcam em todo seu ser. Por que seria?

Ora, porque sou humano, é a obviedade. Porque assim somos: incompletos, buscando a completude por uma existência inteira. Corro, corro, corro, quando o que mais quero é ficar parado; sonho de homem é ser pedra. Mas sou humano, e por mais que deseje um rótulo para ser como a pedra, este rótulo não virá. Eu tenho consciência disso, uma consciência tão grande e tão pesada que com poucos posso compartilhar, minha sina de querer a plenitude e justamente por querê-la descobrir que não posso tê-la – afinal, o que mais seria a filosofia senão a tomada de consciência do homem de seu ser no mundo, com todas as suas impossibilidades inglórias e todas as suas possibilidades infinitas?

Sou humano, e uma impossibilidade me subjaz: ser somente, ser pedra. Mas por ser humano, todas as possibilidades do mundo se abrem para mim – eu escolho o que ser, mesmo sabendo que este ser nunca ficará em silêncio e sempre se projetará para o mundo me lembrando de que eu estou vivo. Sim, sou no mundo. Não há sentido para o ser humano se não como uma consciência no mundo, num além de si que acaba dando significado a este turbilhão ao que chamamos “eu”. Todos podem entender estas palavras? Não, porque se pudessem o mundo seria melhor – teríamos homens livres discutindo valores, haveria respeito mútuo e um senso de beleza no outro que hoje é praticamente anedota. Utopia? Aboli o maniqueísmo de minha vida a certo tempo, como os adultos geralmente fazem, então a questão não é se é sonho ou realidade.

Pessoas que vivem somente de sonhos não dão frutos, pessoas que se atentam somente à realidade cotidiana esquecem que podem mudá-la. O que é o tempo? Condição de possibilidade de conhecimento, segundo Kant, vá lá. Um dia, num período de dor muito grande, escrevi que o que somos nada mais é do que as lembranças passadas e os sonhos futuros – o presente é só passagem. Mesmo correndo o risco de parecer repetitivo, não é isso? Construção, construção, construção, com as plantas baixas na cabeça sempre apontando um devir. Desejo de homem é ser pedra. Cada lembrança minha é um degrau que me empurra pra cima, cada sonho meu é um degrau me chamando pra um café – ou cerveja, se onde estiver este tal degrau for quente como aqui. Nossa vida é movimento – por que não entrar no reino da redundância?

Eu aprecio esta vida, eu aprecio ser humano, eu aprecio não caber em rótulos. Eu aprecio minha incompletude. Aprecio poder escolher, aprecio saber que escolhendo eu me responsabilizo. Eu aprecio ser este turbilhão para fora de mim, que depende tanto dos outros para ser algo. Sim, sou humano; imperfeito, tijolo por tijolo – é a graça. Quem sou eu? Aquilo que pareço. O que pareço? Isso não importa, não para mim. Seria egoísmo demais me fechar em mim e colocar ‘fechado para balanço’ - não é justo com as pessoas que me cercam. Quem sou eu? Alguém que vive, está e não está, que ao mesmo tempo é e não é, que é uma constante mudança.

Sei lá, sou alguém que às vezes se cansa. Sou humano, não um rótulo.

Nenhum comentário: