Pesquisar este blog

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Um dia em Porto Alegre


Onze e meia. Acabara de sair da prova sobre o projeto. Por que a apercepção empírica é fundamento para o argumento refutativo da segunda Crítica? Uma folha e meia escrita, de duas que fizera no rascunho. Antes menos do que mais, prolixidade nestas horas não ajuda. Sensação de satisfação, a pressão de antes da prova se fora. Faltava a de francês, uma lida em Sartre depois do almoço seria uma boa.

- E aí cara, vamo comer?
- Pode ser, to vendo onde é o ru.
- Tem essa cantina aí na frente, se pá...
- Caro né. Vamo vê onde é o ru.
- Beleza. Ce é de onde?
- UFPR, e você?
- Uem. Prazer - trocaram cumprimentos.
- Estuda o que?
- Kant, a refutação do idealismo, e você?
- Schopenhauer, a redução que faz das categorias à categoria de causalidade. Perguntaram sobre como pode fazer isso e prescindir das explicações de Kant, foda.
- Me parece que sim... o meu foi mais sussa.

Já iam em direção ao ru, os blocos eram cercados de verde, uma uem com espírito de federal. Aconchegante seria um bom termo para aquele lugar. Muita gente, muita vida. Descrição imprecisa, mas não precisa passar disso. Chegaram ao ru, bandeijas conhecidas, comida liberada com suco a dois e setenta.

- Fechou velho.
- Certeza.


Meio dia. Bandeijas cheias....
Muita gente. Muita gente aparentemente interessante. Tava ficando bom.

- Meu, nestas horas é foda - mostrou a aliança na direita.
- Entendo - riso de canto de boca. Bom, vou ver se dou uma lida do Sartre depois do almoço... não tenho a menor idéia de como essa prova vai ser.
- Tente fazer uma tradução rápida. Só não faça se estiver muito confiante. E quanto à leitura, máximo de quinze minutos, para te colocar no clima. Mais que isso não adianta.
- Bom saber. Meu primeiro teste, não sei bem o que esperar.

Acabaram, voltaram ao bloco, um foi atrás de café e outro de um orelhão:

- Vou pra Caxias. Namorada é de lá.
- Bom se passar aqui então, né.
- Ô, demais.

Uma e meia. Algumas conversar interurbanas, cafés, e um disco de Garbage no ouvido depois, voltaram a se encontrar no corredor da sala das provas. A leitura de Sartre pareceu desnecessária, o que sabia sabia, o que não, fazer o quê. Havia agora mais um de Curitiba, dessa vez um aristotélico. Se conheciam os da ufpr, mas não sabiam que ambos viriam para cá. Desencontros.

- E aí, como foi na prova da manhã?
- Sei não ein. Pergunta difícil.
- Pressupostos de nossos projetos... duro é que tem uns pressupostos que trabalhamos mais, outros menos... qual vai cair, é duro...
- É...
- E tem que ver qual professor vai corrigir. Tomara que seja os especialistas em cada área.
- É bom - os três concordaram.


Duas horas. Teve vergonha do pequeno Michaellis que levou. O da frente estava com literalmente dois tijolos e mais um pequeninho - respeito à minoria, só pode. Mas estando na água, vai de ponta piá: contextualiza, ce é bom nisso. Leibniz e a ordem no mundo. O mundo tem ordem, se aparenta diferente é falha nossa. Uma linha feita aleatoriamente ainda sim é submissível a uma regra, só falta que achemos tal regra. Deus é perfeito, logo fez o mundo da melhor maneira possível, a saber, da hipótese mais simples tirou a maior número de fenômenos. Então, o mundo é racionalizável. Cinco linhas, e pá, tava de boa. Acabou que deu uma página, menos ia ficar feio. Uma hora para traduzir, meia hora pra rascunhar a análise, meia hora pra passá-la a limpo. Sussa, mais do que imaginara.

Quatro horas. Aguardara os outros dois sair, faltava dez minutos para o tempo limite. Mais uma vez, uma sensação boa tomava-lhe. Agora, só faltava a entrevista. Mas deixou de lado, era só no outro dia. Os outros apareceram.


- E aí, como foram?
- Tranquilo.
- Dois.


Apareceu um quarto, do interior do rio grande. Professor do estado e munícipio, estudava filosofia da mente. Todos hospedados perto da rodoviária, foram ao ponto de ônibus. A pressão das provas se dissipara, e o dia era bonito pelas cinco da tarde.


- Cara, bom para uma cerva ein - a assertiva ficou solta no ar.

Seis horas: Chegaram à rodoviária, o do rio grande seguiu mais um ponto, se separando. Com os horários das entrevistas definidos, cada um para o seu guichê marcar a volta. Um para a multicultural Curitiba, outro para a amorosa Caxias, e um terceiro para o local onde seus r não ficassem tão deslocados. Dados os trâmites legais, o Sol ainda presente, e nada mais do que um hotel meia boca com uma Telefunken que se esforçava para gerar cor os esperava. Não deu outra: à cerveja!

Simples falar, nem tanto cumprir:

- Onde vamos?
- Meu, não tenho a menor idéia. Onde tem um buteco?
- Vo perguntar para o tiozinho do cachorrão. Comi ali ontem à noite, vamo ve se ele ajuda.

Mas nem era o mesmo cara, nem demonstrou muita vontade para ajudar. Para parecer politicamente correto, perguntara sobre o local para tomar uma coca... mas coca ele tinha ali, pô. Deu-se conta da mancada:

- Er... uma cervejinha.. tem algum lugar por perto.
- Aí ó - falou apontando para a rodoviária.

Fique com seu bumbum dezoito horas em um ônibus e veja se dá pra tomar uma cerveja na rodoviária em seguida! Nem a pau! Pega trauma, ce reza três vezes para não permanecer ali de qualquer outra forma que não para embarcar no suplício da volta. Tirar um lazer ali é tiração de sarro do tiozin, só pode. Foram pela passarela, se não achassem um bar ao menos conheciam um pouco mais de poa.

E como tinha gente. Se bem que com aquelas calçadas de um metro de largura qualquer meia dúzia virava turbilhão. Mas era gostoso - entra e sai de loja, ônibus que vai e vem, igreja com cara de começo de século passado, e um prédio de tijolinhos muito show de bola - era a agência de um banco de um deles, quase que ele entra só pra ver como era lá dentro. Mas tirando a riqueza arquitetônica, faltava o elemento principal: o bar! Mesas na calçada, cervas geladas, clima da camaradagem, se pá uma música e o esquecimento da tal da entrevista que os aguardava. Por que raios não faziam um calçadão por ali? Como turistas  exigentes como nossos heróis viveriam felizes se onde deveria haver bares havia lojas de confecção, bancos, ruas para fomentar a vida sedentária de carros, e por aí vai! Façamos revolução!

Ou não. O lance, com o pouco tempo, seria aceitar a ordem estabelecida. Injúrias só as que faziam entre si, sarristas. Na verdade foi bem legal. Chegaram numa subida com um monte de prédios antigos, meio barrocos. Velho, surreal. Deveriam tomar por patrimônio histórico, se não o tivessem feito ainda.

- Ó, lá em cima tem uma árvore no meio da rua, deve ser uma praça.
- Praças têm bar!
- Simbora.

Mas aquela não tinha. Busca encerrada, vamos para uma lanchonete ou o que aparecer, combinaram. A primeira que tentaram tinha somente latas.

- E aí, que vocês acham?
- Nem... lata por lata a gente compra e vai pro hotel.
- Concordo.
- Então andemos.

Perto da li, avistaram mocado numa lanchonete de esquina e abaixo do nível da calçada o ouro escondido: radiava um grande e bonito refrigerador da polar! Estamos salvos, foi o pensamento geral.

Tá que não tinha música e sem mesas para fora. Era uma lanchonte, uai, fazer o que. Mas pensem no contexto. Cidade nova, dia novo, amigos novos. Uma vontade danada de estar ali, trocar opiniões, dar risada. Junte-se a isso um dono de bar que senta do lado com uma boemia e alega veementemente que o luxemburgo não é técnico, nem o muricy, e que elenco por elenco o inter deveria ter ganho. E depois de três polares gelada, que segundo o dono do bar não era a mesma coisa que antartica (o maringaense provocara, segundo suas fontes gaúchas), aquele cantinho de Porto Alegre ficara agradavelmente familiar. Era  bem possível uma vida ali. Onde morar se passassem, qual orientador teriam, o que estava em jogo com aquelas provinhas que fizeram no decorrer do dia.

Ah, e finalmente, no meio da conversa souberam seus respectivos nomes. Élcio, Marco e Thiago. Faltou o do dono do bar. Fica para a próxima.

Pra chegar nos enfins: foi um ótimo dia.




2 comentários:

silvana! disse...

Você precisa descobrir a cidade baixa!!!!!! heheheheheh...

Marco Fabretti disse...

certeza minha cara, certeza...

huaihaiuhauaha

te cuide