- Galera, hoje provavelmente será nossa última aula... bom, quem tem perguntas ou redações para entregar?
Uns quatro entregaram as derradeiras.
- Bom, círculo, agora...
- Como?
- Formem um círculo... eu espero.
Foram carteiras que se arrastavam, cochichos que se fizeram, dois minutos e a sala se refez em uma nova forma. Os grupos tradicionais, já conseguia identificar mais ou menos quem era quem, e quem conversava com quem.
- Moçada, sobre as questões, faltam umas quatro para eu corrigir, então não vou entregar agora... Mas adianto que houve pessoas que me surpreenderam, foram muito bem. Parabéns à Ayumi, à Bárbara, à Rúbia.
A sala atenta.
- Houve aqueles também que, se não foram tão bem na interpretação, o fizeram de maneira satisfatória – tentando acessar o texto com o próprio pensamento. Isso foi muito bom. Agora, para aqueles que copiaram ou que não levaram a sério, não preciso dizer muita coisa. Ceis podiam ficar em casa né...
Eu não digerira ainda aquelas cópias; mas agora elas já não importavam.
- O que eu gostaria de que vocês tivessem assimilado? Bom, primeiro, esqueçam essa história de que o existencialismo é contra Deus... aqueles que insistiram nisso têm que reler o texto, não entenderam muita coisa. Vocês acham que filosofia se resume a uma disputa com Deus? Nem, ela é maior do que isso, pro bem ou pro mal.
- Quem sou eu? Alguém aqui me responde? Você aí, e não vale dizer o nome...
- Ah professor, eu sou um homem!
- Muito bom... Alguém mais?
Aquelas meninas olhavam, eu sabia que estava sendo observado por elas. Não abriram a boca, mas prestavam atenção. O rapaz da redação do Joãozinho também: desde o dia da flor que era feia, eu era um professor para ele. Ayumi estava ao lado meu, começo do círculo.
- E o certo e o errado, o verdadeiro e o falso? Há um valor universal para o bem, para o certo, para o verdadeiro?
- Sim!
- Qual?
- Não sei.
- Daí não vale.
A sala irrompia num silêncio. Ora, eu só perguntei do que é certo para eles, não havia dito nada sobre Deus. E a verdade, todos ali tinham uma noção do que era, então por que não podiam falar?
- O certo para mim é para mim, somente, professor.
- Bom, então o certo é relativo?
- É..
- Todo mundo concorda?
Com muito custo, o rapaizinho do valor universal disse novamente:
- Não, tem que ter um certo...
- Por quê?
- Não sei...
- Então não vale... Moçada, se o que a Marcela está falando é verdade, não há justiça... não há nada mais do que a lei do mais forte (não fora para contra essa tese que Platão escreveu a República?). Ninguém aqui consegue me dizer o contrário?
Vieram tentativas. Não muito razoáveis, mas tentativas. A aula estava acabando, era a última de regência...
- Moçada, um pouquinho de vossa atenção... São nossos últimos minutos né?
- Professor, e você, quem é?
É mole? Aos quarenta e quatro do segundo tempo os espertinhos me mandavam uma dessa?
- No que você acredita? – um reboliço geral: eles sabiam que tinham me pegado.
- Bom, eu? Ãhh... deixa eu ver... estudante de filosofia!
- E...
- Ah, com esse barulho todo eu não consigo falar – eu estava vermelho, e tinha plena noção disso.
- Errrr.... – o coro me colocava contra a parede.
Dei sorte que eles comentavam uns com os outros a situação, e mudei de assunto:
- Mas então gente, o texto de filosofia não é importante porque valeu nota... A nossa intenção era fazer com que vocês lessem, e leitura é estritamente individual. Eu tenho certeza que alguns de vocês captaram o sentido do texto, e toda a carga problemática dele. E alguns ficaram tão preocupados com nota que responderam sem de fato entender. Bom, cada um tem um ritmo, mas agora esqueçam a nota... o texto está com vocês, leiam novamente, quando tiverem vontade, sem compromisso. Se não estiverem gostando, feche-o e tente outra hora. É isso que um texto de filosofia faz: fala-nos à alma. Cada um aqui, e eu tenho certeza disso, tem um pouquinho de si mesmo neste texto. Eu espero que vocês possam, um dia, perceber também.
Eles escutavam. O círculo e eu.
- Bom, alguém quer falar algo sobre Sartre? Não? Então estão liberados... façam o que quiser.
A sala em alvoroço se levantou. Todos em direção à liberdade! O vida cruel:
- Ops, façam tudo, menos sair da sala... - eu disse e sorri.
- Ahhhhhhhhhhhhhhhhh – veio o coro, e eu só sorrindo, deslavadamente.
No fim, eu já tomando o rumo da saída, vieram algumas alunas:
- Professor, você não respondeu quem era...
- Prazer, Marco – a mão estendida, na maior cara de pau.
- Ah, você disse que a gente não poderia responder assim...
- Sim, mas eu sou o professor, e sou total autoritarismo! – Cadê o óleo de peroba? Quase apanhei.
Ai ai, eu me divirto.
Uns quatro entregaram as derradeiras.
- Bom, círculo, agora...
- Como?
- Formem um círculo... eu espero.
Foram carteiras que se arrastavam, cochichos que se fizeram, dois minutos e a sala se refez em uma nova forma. Os grupos tradicionais, já conseguia identificar mais ou menos quem era quem, e quem conversava com quem.
- Moçada, sobre as questões, faltam umas quatro para eu corrigir, então não vou entregar agora... Mas adianto que houve pessoas que me surpreenderam, foram muito bem. Parabéns à Ayumi, à Bárbara, à Rúbia.
A sala atenta.
- Houve aqueles também que, se não foram tão bem na interpretação, o fizeram de maneira satisfatória – tentando acessar o texto com o próprio pensamento. Isso foi muito bom. Agora, para aqueles que copiaram ou que não levaram a sério, não preciso dizer muita coisa. Ceis podiam ficar em casa né...
Eu não digerira ainda aquelas cópias; mas agora elas já não importavam.
- O que eu gostaria de que vocês tivessem assimilado? Bom, primeiro, esqueçam essa história de que o existencialismo é contra Deus... aqueles que insistiram nisso têm que reler o texto, não entenderam muita coisa. Vocês acham que filosofia se resume a uma disputa com Deus? Nem, ela é maior do que isso, pro bem ou pro mal.
- Quem sou eu? Alguém aqui me responde? Você aí, e não vale dizer o nome...
- Ah professor, eu sou um homem!
- Muito bom... Alguém mais?
Aquelas meninas olhavam, eu sabia que estava sendo observado por elas. Não abriram a boca, mas prestavam atenção. O rapaz da redação do Joãozinho também: desde o dia da flor que era feia, eu era um professor para ele. Ayumi estava ao lado meu, começo do círculo.
- E o certo e o errado, o verdadeiro e o falso? Há um valor universal para o bem, para o certo, para o verdadeiro?
- Sim!
- Qual?
- Não sei.
- Daí não vale.
A sala irrompia num silêncio. Ora, eu só perguntei do que é certo para eles, não havia dito nada sobre Deus. E a verdade, todos ali tinham uma noção do que era, então por que não podiam falar?
- O certo para mim é para mim, somente, professor.
- Bom, então o certo é relativo?
- É..
- Todo mundo concorda?
Com muito custo, o rapaizinho do valor universal disse novamente:
- Não, tem que ter um certo...
- Por quê?
- Não sei...
- Então não vale... Moçada, se o que a Marcela está falando é verdade, não há justiça... não há nada mais do que a lei do mais forte (não fora para contra essa tese que Platão escreveu a República?). Ninguém aqui consegue me dizer o contrário?
Vieram tentativas. Não muito razoáveis, mas tentativas. A aula estava acabando, era a última de regência...
- Moçada, um pouquinho de vossa atenção... São nossos últimos minutos né?
- Professor, e você, quem é?
É mole? Aos quarenta e quatro do segundo tempo os espertinhos me mandavam uma dessa?
- No que você acredita? – um reboliço geral: eles sabiam que tinham me pegado.
- Bom, eu? Ãhh... deixa eu ver... estudante de filosofia!
- E...
- Ah, com esse barulho todo eu não consigo falar – eu estava vermelho, e tinha plena noção disso.
- Errrr.... – o coro me colocava contra a parede.
Dei sorte que eles comentavam uns com os outros a situação, e mudei de assunto:
- Mas então gente, o texto de filosofia não é importante porque valeu nota... A nossa intenção era fazer com que vocês lessem, e leitura é estritamente individual. Eu tenho certeza que alguns de vocês captaram o sentido do texto, e toda a carga problemática dele. E alguns ficaram tão preocupados com nota que responderam sem de fato entender. Bom, cada um tem um ritmo, mas agora esqueçam a nota... o texto está com vocês, leiam novamente, quando tiverem vontade, sem compromisso. Se não estiverem gostando, feche-o e tente outra hora. É isso que um texto de filosofia faz: fala-nos à alma. Cada um aqui, e eu tenho certeza disso, tem um pouquinho de si mesmo neste texto. Eu espero que vocês possam, um dia, perceber também.
Eles escutavam. O círculo e eu.
- Bom, alguém quer falar algo sobre Sartre? Não? Então estão liberados... façam o que quiser.
A sala em alvoroço se levantou. Todos em direção à liberdade! O vida cruel:
- Ops, façam tudo, menos sair da sala... - eu disse e sorri.
- Ahhhhhhhhhhhhhhhhh – veio o coro, e eu só sorrindo, deslavadamente.
No fim, eu já tomando o rumo da saída, vieram algumas alunas:
- Professor, você não respondeu quem era...
- Prazer, Marco – a mão estendida, na maior cara de pau.
- Ah, você disse que a gente não poderia responder assim...
- Sim, mas eu sou o professor, e sou total autoritarismo! – Cadê o óleo de peroba? Quase apanhei.
Ai ai, eu me divirto.
4 comentários:
Bicho, te fodeu com a perda dos comentários! hahahahhahahahahahahahahah
Abraço!
Só por curiosidade, qual foi o texto que você deu a eles? Eu vou ler também! HAHAHAHA
"o existencialismo é um humanismo", texto que pode ser dito introdutório.
e meu caro Rudah, concordo plenamente... huaaiuauaa
abraço
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